Desespero
Andava um tanto
quanto desnorteada pelo píer, com os pés descalços e nenhuma perspectiva de
voltar. Sabia (aliás, sempre soube) que nascera para brilhar, tinha potencial,
mas algo a impediria. Não, não era o medo que a habitava naquele momento. Eram
os fatos do cotidiano, os anos passando rapidamente e tudo sendo deixado para
trás. Agora, ali, frente à água azul do oceano, ela fechou os olhos e deixou
que a leve brisa a tocasse lentamente. E chegou a conclusão de que o momento
havia chego. Era ali, que tudo terminaria. Chegou a hora de se despedir de seus
sonhos. A menina que sonhava ser uma bailarina, ter um vestido de boneca,
ajustado perfeitamente ao contorno de sua bela cintura, agora estava de preto.
Todos que a estavam aguardando esperavam vê-la de branco, com luvas até os
cotovelos e os cabelos presos num penteado clássico e elaborado.
Na realidade,
vestia branco. Mas enxergava um vestido preto. No pescoço havia um belo colar
com uma pedra de rubi gigantesca (presente do matador, a propósito), mas ela
sentia aquilo como um punhal cravado, minando sangue.
Tudo o que
construiu e sonhou, acabaria ali. Que falta faria se, por um “descuido” (é o
que diria a polícia, “descuido”), tropeçasse, escorregasse... Caísse na água?
Aquilo aconteceria mais cedo ou mais tarde. Então melhor que fosse antes de
colocar aquela aliança.
Sem pensar mais,
ela levantou a perna esquerda e pisou no nada, de olhos fechados. Caiu na água
e pela sua cabeça, só passava o pensamento de que estava fazendo o melhor para
si. Depois da cerimônia, jamais poderia realizar os propósitos que tanto
sonhara.
E no jardim da bela
casa, os convidados estavam esperando ansiosos para ver a noiva, com seu
vestido de princesa, chegar na bela Chrysler PT Cruiser.
O noivo então, nem
se fala. Esperava sua bela chegar, para que pudesse enfim anunciar que os
sonhos mais marcantes dos dois se realizariam depois da cerimônia. Ele
finalmente contaria a ela que além de ter economizado o bastante, desde o
início do relacionamento, para leva-la à antiga e romântica Grécia (sonho dela
desde sempre), recebera também, naquela manhã, uma notícia que faria qualquer
dúvida, desnorteio, sentimento de infelicidade ou intenção de suicídio
possível, esvair-se de dentro dele. A chegada de Ana, primeira filha
do casal, não foi planejada, mas foi sua maior alegria. Aquele simples pedaço
de papel, um exame de sangue, tornou-se o maior presente que a noiva receberia
naquele dia.
*Offer (By Alanis Morissette)
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